A MARCA NO ROSTO
No colegial fiz um curso fotografia, aprendi técnicas como: Regra dos terços e Proporção Áurea (torna as imagens mais agradáveis), Longa Exposição (utiliza a iluminação em movimento formando desenhos), Panning (fotografia de objeto em movimento que dá a impressão que ele pareça imóvel e a sensação de velocidade venha do fundo em “movimento”), Lens Flare (uma distorção do raio de luz quando ele entra diretamente pela lente – porém pelas bordas, não exatamente pelo centro.), Golden Hour (utiliza a iluminação do pôr ou no nascer do sol), Contraluz (quando o objeto a ser fotografado é colocado entre a câmera e a fonte de luz, fazendo com que a iluminação fique na parte de trás do elemento e não na frente, como o usual. Isso faz com que o fundo fique mais claro e produz lindas imagens de silhuetas, ou de maneira suave pode realçar o objeto) e o Bokeh (técnica que utiliza desfoque ocasionado pelas luzes ou áreas ao fundo da imagem).
Utilizei várias dessas técnicas em diversos e incontáveis momentos, talvez até conte alguns desses outros momentos, mas o que me lembro agora foi o Bokeh, que se tornou minha técnica favorita, sendo para mim a mais significativa.
Utilizei desta técnica para fotografar uma das mais belas garotas que conheci naquela época. Uma jovem de olhos claros – verdes - e cabelos curtos e muito escuros. Tinha seios pequenos e um corpo esguio. Conheci Léa num curso de impressão. Na aula de litografia percebi que tinha traços fortes, como sua personalidade. Delicada a limpar a pedra, suave. Na aula de xilogravura, tratava a madeira de forma mais desajeitada e sem paciência.
Comecei a conversar com Léa com um certo receio, não sei se por eu ser inocente ou por ela ser um objeto de desejo de muitos que me olhavam com olhares fatais. Apenas me lembro que não me sentia tão confortável com a amizade daquela garota até tirarmos algumas fotos que me marcam e acredito que a ela também.
Estávamos saindo da cantina, conversando sobre as aulas de impressão e sobre minha nova paixonite (sim, naqueles dias sofria do mal adolescente de me apaixonar a cada 5 minutos), quando saco minha câmera e digo; - Sorria!
Léa responde com um sorriso amarelo sem graça e mostra a língua com um ar de colegial (afinal, ela era uma colegial).
Eu grito: CÍNICA!
Léa não agüenta e cai na gargalhada. Eu registro o momento fotografando.
Léa grita e briga comigo, ameaça me agredir com a sua força de garota magra, para que eu entregasse o filme da máquina fotográfica (não havia câmeras digitais naquela época).
Eu respondo sarcasticamente: -Não bate que eu gamo, hein!
Ela responde com um tapa na minha cara, e com um olhar cínico e diz: - Então que seja meu, o seu coração.
Com o impacto do forte tapa, do forte gênio, é inevitável a minha queda no pavimento dos corredores.
Ela toma minha máquina fotográfica no susto, e imortaliza em imagem a marca em meu rosto.
As pessoas saindo das salas, adentrando nos corredores e vendo os cinco dedos de Léa estampados em minha face. Preocupados e confusos.
Levanto e apenas sussurro: - Tapa de amor não dói! E eu sou um mero apaixonado.
Léa e eu sentimos risos tempestuosos saírem de nossos corpos e risadas incontroláveis e loucas. Nos retiramos por impulso do local.
Após o incidente, já contendo as gargalhadas, Léa me pergunta quem é minha nova paixonite. Eu respondo: - Pode ser você? E volto a rir.
Ela responde: -NÃO!!! Com um ar debochado e insinuando minha loucura.
-Ah, você não acredita em amor? Eu pergunto debochando também.
-Amor é coisa de cinema. Ela responde com uma voz doce forçada.
-Então vamos fazer um filme! Acrescento com uma voz atuante de apaixonado.
Voltamos a rir, o riso adolescente e sem sentido.
Tá, falando sério agora. Quem é a nova paixonite? – ela questiona.
Isso é importante? Acho que devemos sair daqui e esperar duas horas, - eu respondo.
Léa com cara de curiosa pergunta: -Por que esperar duas horas? Ela vai chegar?
Eu respondo: -Não, mas as fotos ficarão prontas se mandarmos para a revelação.
Reveladas as imagens na foto de Léa, ela aparece nítida, num fundo borrado no melhor estilo Bokeh, com um sorriso que “quebra minhas pernas” e com um olhar fixo que nunca me deixou mentir.
E a minha imagem, com um olhar digno de pena, com os óculos virados e a marca em meu rosto, a vergonha em minha alma pela impressão dos 5 dedos e o riso reprimido pelo susto momentâneo.
Nós representados para sempre, inalterados e eternos. Se uma imagem vale mais que mil palavras, essas duas imagens eu aposto não terem preços, apenas muito apreço.
Kevin Rodhes - personagem do livro Terapia escrito por djpandacwb

Mídias, artigos acadêmicos, multidisciplinaridade, arte, história em quadrinhos, contos, poesias, tirinhas, fotos, imagens. Diário de um artista amador.
artista:def. pessoa que cultiva as belas-artes ou as artes mecânicas; pessoa que exerce uma arte; amante das artes; talentoso; astuto, manhoso.
amador:def. namorador; apreciador; cultor curioso de qualquer arte; aquele que tem conhecimentos pouco aprofundados sobre determinado assunto.
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