QUADRINHOS
Aprendi muito sobre quadrinhos com uma ex-namorada. Tânia era magra, loira, alemã de olhos castanhos. Ela adorava dançar, quadrinhos, principalmente animes e mangás. Adorava cozinhar e me cozinhar, me deixava horas esperando, me enrolava quando eu tentava estabelecer algum tipo de relacionamento. Sim, eu era o enrolado.
Era uma época onde eu achava importante delimitar o relacionamento. Ter espaços definidos, enquadrarmos em alguma categoria amorosa, termos espaço separados e em conjunto.
Ela curtia cosplay e tudo ligado ao Japão, antenada em tecnologia e uma profissional da arquitetura muito competente, mas sua arte, sua paixão, sempre foi a arte da culinária. Tinha dado um bonsai de presente para ela, era um pet, um bichinho de estimação e ele acabou morrendo.
Sempre quis ter um bonsai. Sou da teoria de plantar uma árvore, escrever um livro. (Posso ignorar a parte do ter filhos? O mundo já tem muitos – prefiro ser adepto da teoria da extinção humana voluntária. Ok, não tão radical, mas adoção é com certeza uma opção).
Sempre com um título novo, um lançamento para assistirmos no cinema. Tânia era divertida. Tive que reprisar todos os vídeos de: Evangelion, Great Teacher Onizuka, Love Hina, Lodoss War, Samurai Champloo, Yu Yu Hakusho, Doraemon e Cowboy Bebop.
Nos mangás tinha uma fascinação por Yu Yu Hakusho, Doraemon, Death Note. Admiradora de Cláudio Seto, assim como eu, porém num nível de idolatria.
Eu sempre fui muito fã das histórias da Marvel Comics graças ao mestre Stan Lee e dos Personagens de Clerks: Jay e Silent Bob de Kevin Smith.
Discutíamos sempre sobre as influências norte americana e japonesa nos quadrinho, estudávamos um pouco os textos de Will Eisner e Scott McCloud.
Fora os beijos agressivos, a pegada forte e os deliciosos pratos (a alemã e a torta alemã), o que mais lembro eram de nossas discussões. Principalmente sobre nosso relacionamento. Acho que insegurança minha, ou implicância dela.
Sempre desconfiei que Tânia teve um relacionamento amoroso com sua melhor amiga Micheli. E não, não era uma tara de pensar na melhor amiga da namorada. Era uma coisa de olhar, um rastro psicológico. Talvez um pouco como a série Estranhos no Paraíso (um caso como Francine e Katchoo).
Até que eu resolvi perguntar.
Tânia riu sarcasticamente, negando com a cabeça. Na verdade não sei se foi sarcasticamente, pois não entendi se ela tinha um relacionamento amoroso e até hoje não sei o que eu quis perguntar, quando disse relacionamento amoroso. (Claro que algum tipo de relacionamento amoroso elas tinham – eram melhores amigas).
Perguntei então: - Vocês já fizeram sexo?
Ela respondeu: - Não é da sua conta! (de modo misterioso e sério).
Não consegui minha resposta. Coloquei-a na parede para definirmos nosso relacionamento.
Ela respondeu: - Sem espaços definidos, nem delimitados. Não temos mais um relacionamento. Temos leituras diferente numa mesma mídia. A vida nos transformou, nosso momento passou. Agora sobra o espaço decadente da sarjeta. Acho melhor terminar.
Eu retruquei. – Você sabe o que é a sarjeta nas histórias em quadrinhos? A sarjeta é o espaço entre os quadros, onde a mágica acontece. Onde transformamos os quadros estáticos em movimentos. É onde a ficção se torna realidade, com a vontade e imaginação do artista e do leitor.
É a parte que respeita os espaços e dá tempo para pensarmos. É onde a individualidade se torna conjunto.
Nos beijamos.
Terminamos semanas depois. Ela não respeitava mais meu quadro.
Ela quis voltar, mas pensava demais na sarjeta. Precisamos de no mínimo dois bons quadrinhos para a sarjeta funcionar. O espaço vazio não é insignificante, mas não funciona se a imaginação é de um só espaço delimitado. Seria cada um no seu quadrado? Seria a sarjeta o equilíbrio? Ainda não tinha descoberto, mas já pensava a respeito.
Kevin Rodhes - personagem do livro Terapia escrito por djpandacwb
Mídias, artigos acadêmicos, multidisciplinaridade, arte, história em quadrinhos, contos, poesias, tirinhas, fotos, imagens. Diário de um artista amador.
artista:def. pessoa que cultiva as belas-artes ou as artes mecânicas; pessoa que exerce uma arte; amante das artes; talentoso; astuto, manhoso.
amador:def. namorador; apreciador; cultor curioso de qualquer arte; aquele que tem conhecimentos pouco aprofundados sobre determinado assunto.
sexta-feira, 27 de abril de 2012
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